Muito se tem dito a respeito da decisão do STF sobre a descriminalização da posse de cannabis ativa para consumo pessoal, informações equivocadas do tipo “todos podem plantar e consumir maconha sem consequências” vêm sendo veiculadas, razão pela qual necessário se faz o enfrentamento.
Com este artigo, pretendemos abordar os itens da decisão proferida no Recurso Extraordinário 635.659 – Repercussão geral – tema 506.
É importante ressaltar que a presunção que recai sobre a quantidade de drogas é relativa, tanto para o consumo pessoal quanto para o tráfico.
Ou seja, o fato de portar 40 gramas de maconha não significa necessariamente que é usuário, pode ser tráfico, ao passo que o porte em quantidade superior a isso também não gera presunção absoluta de ser traficante.
A partir de agora, analisaremos cada um dos oito itens da decisão:
Descriminalização da conduta do artigo 28 da Lei 11.343/06.
“Não comete infração penal quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação de sanções de advertência sobre os efeitos dela (art. 28, I) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (art. 28, III);” (grifo nosso)
De acordo com o item 01 do tema 506, houve a descriminalização da conduta descrita no artigo 28 da lei de drogas.
A conduta é atípica, porém, a pessoa será submetida aos efeitos dos incisos I e III do artigo 28.
Muito se tem visto a respeito de que a partir de agora, a maconha poderá ser consumida diante das autoridades policiais. Ledo engano.
A apreensão da droga será uma consequência, pois poder ser que apesar da quantidade, seja tráfico.
Isso será melhor abordado quando tratarmos a respeito da presunção de posse para consumo pessoal, que é relativa, e não absoluta.
Aplicação de sanções pelo juiz em procedimento de natureza não penal.
“2. As sanções estabelecidas nos incisos I e III do art. 28 da Lei 11.343/06 serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta;”
Portanto, percebe-se que haverá sim consequências à posse de cannabis ativa para consumo pessoal, contudo, não haverá nenhuma repercussão criminal para a conduta. A divergência fica entre ser de natureza civil ou administrativa.
Competência para o processamento e aplicação das sanções.
“3. Em se tratando da posse de cannabis para consumo pessoal, a autoridade policial apreenderá a substância e notificará o autor do fato para comparecer em Juízo, na forma do regulamento a ser aprovado pelo CNJ. Até que o CNJ delibere a respeito, a competência para julgar as condutas do art. 28 da Lei 11.343/06 será dos Juizados Especiais Criminais, segundo a sistemática atual, vedada a atribuição de quaisquer efeitos penais para a sentença;”
A princípio, a competência será do JECRIM, malgrado esteja claro que os efeitos da sentença serão extrapenais. No futuro, a competência poderá ser deslocada, por exemplo, aos Juizados Especiais Cíveis.
Critérios para a presunção de usuário
“4. Nos termos do § 2º do artigo 28 da Lei 11.343/2006, será presumido usuário quem, para consumo próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito;”
Em que pese os critérios estabelecidos neste item, cumpre ressaltar que a presunção é relativa, razão pela qual a substância deverá ser apreendida.
Entretanto, se por um lado a presunção de usuário a quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas seja relativa, a presunção do tráfico também o será, a depender das circunstâncias do caso concreto.
Relatividade da presunção de usuário.
“5. A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas, mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido, quando presentes elementos que indiquem intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes;”
Este item demonstra a razão pela qual a droga deverá ser apreendida, pois a depender das circunstâncias do caso concreto, a conduta poderá ser enquadrada como tráfico de drogas e, ainda que se considere a posse para consumo, haverá consequências de ordem extrapenal.
Dever da Autoridade Policial de justificar no APF o afastamento da presunção relativa.
“6. Nesses casos, caberá ao Delegado de Polícia consignar, no auto de prisão em flagrante, justificativa minudente para afastamento da presunção do porte para uso pessoal, sendo vedada a alusão a critérios subjetivos arbitrários;”
Cumpre ressaltar que o descumprimento desse dever implicará em responsabilização criminal, civil e administrativa por parte da autoridade policial.
Dever de reanálise da autoridade judiciária.
“7. Na hipótese de prisão por quantidades inferiores à fixada no item 4, deverá o juiz, na audiência de custódia, avaliar as razões invocadas para o afastamento da presunção de porte para uso próprio;”
Malgrado o item se refira a “quantidades inferiores à fixada no item 4”, com base no princípio constitucional segundo o qual todas as decisões deverão ser fundamentadas, entendemos que essa análise sempre deva ser realizada pelo juiz que preside a audiência de custódia.
Presunção relativa da condição de traficante
“8. A apreensão de quantidades superiores aos limites ora fixados não impede o juiz de concluir que a conduta é atípica, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário.”
Conforme ressaltamos anteriormente, se a presunção de usuário a quem se enquadra aos requisitos do tema 506 é relativa, o mesmo vale à condição de traficante aos que sejam presos com quantias superiores às definidas no item 4.
Tudo dependerá das circunstâncias do caso concreto.
Bruno Ricci - OAB/SP 370.643
Contato: (11) 99416-0221

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